Bruno provocou, no ótimo sentido, claro, (no
flog, tudo bem, mas vale) e eu resolvi responder. Porque eu me disse que eu ia falar sobre isso aqui e nem falei. Falo, agora, pois.
Eleições presidenciais na França.
Vou abster-me de comentar a disputa em si e apontar apenas uma coisa com a qual tenho mais intimidade: o comportamento dos franceses diante do processo todo.
Nos dias das duas votações _ de primeiro e segundo turno _ alguns franceses amigos que moram em Campinas reuniram-se aqui em casa pra assistir à cobertura da votação, à divulgação do resultado e ao pronunciamento do(s) vencedor(es). Todo mundo numa ansiedade só, muito vinho pra aguentar a espera, o maior clima de final de Copa do Mundo. E só se falou disso por semanas inteiras. Da participação massiva da população, que superou com folga as marcas das eleições anteriores, e da vitória de Sarkozy, que era tida como certa por quase todo mundo bastante tempo antes do segundo turno, e do que ela representaria, não só para a França, mas para todo o mundo.
Eu poderia dizer que os franceses são mais politizados do que nós, e que acompanham as mudanças políticas de seu país com mais fervor e entusiasmo, mas não é esse o meu ponto.
O meu ponto é: os franceses se acham muito importantes. Claro que isso é horrível, muitas vezes, quem convive com eles sabe bem disso. Mas, em outras vezes, isso é uma prova impressionante de lucidez.
Eles têm perfeita consciência de que a França representa muitos valores que o mundo inteiro tem como fundamentais. Eles sabem que a França ainda é um bastião de resistência contra o autoritarismo, seje ele de que tipo for, ou de onde quer que venha. Têm certeza de que sua cultura e seu modo de vida influenciam, ainda e em grande medida aquilo que se pensa, se produz e se consome por todos os lados.
Vejam bem, eu não estou afirmando que a França representa isso ou aquilo, que é isso ou aquilo, que a cultura francesa faz ou desfaz. Esta é uma mera constatação sobre a visão que os franceses têm deles mesmos.
Pois então. Uma vez que pensam assim, os franceses elegem seus presidentes pensando não só na própria pele, mas também na pele das pessoas do resto do globo. E isso é uma coisa que eu acho muito interessante. Que outro país ou povo tem uma postura como essa diante da humanidade como um todo?
Sarkozy chegou a ser muito temido por suas tendências xenófobas. As pessoas perguntavam-se como ficariam as relações internacionais da França caso ele fosse eleito. Esse pensamento era tão forte que pensadores de todo o país começaram a alertar os eleitores sobre a necessidade de pensar mais na própria França, em sua necessidade de recuperar os índices de crescimento perdidos, coisas talvez possíveis somente com a administração linha dura de Sarkô.
O medo das pessoas deve ter amedrontado Sarkozy ele mesmo, pois seu primeiro discurso depois de eleito foi uma ode à tolerância e à fraternidade entre os povos. Parecia um messias falando. Até seus críticos mais ferrenhos ficaram surpresos com a mudança súbita de postura. Pode ter sido tudo pose, claro, mas pessoalmente quero acreditar que Sarkô percebeu que o povo francês não vai permitir facilmente que se perca de vista os valores que eles acreditam representar.
Não tem conclusão esse post. Talvez queira ser uma espécie de provocação. Porque às vezes eu tenho a impressão de que os brasileiros não conseguem ver tão além assim do próprio umbigo. E eu acho isso meio preocupante. Não estamos sozinhos nessa nave, não é preciso lembrar. O Líbano está em polvorosa de novo, a família de Walid, meu amigo querido, corre perigo mais uma vez. Acho que o mínimo que a gente pode fazer é saber do que se trata aquela confusão toda lá.